Qual é o problema que de fato vale a pena investigar? (Foto: Agência Brasil)

O problema certo

(Helinando Oliveira)

Há uma questão fundamental para todo cientista, e que permeia sua carreira inteira: qual é o problema que de fato vale a pena investigar? Há uma relação inegável da resposta a esta pergunta com os temas explorados no doutorado, mesmo que não haja limite para as mudanças. Por vezes, o problema cai em desuso, ou mesmo é absorvido por outro, dada a dinâmica do tempo e da própria ciência.

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Neste sentido, um balanço entre a extrema especialização e o conhecimento diverso de técnicas/procedimentos diferentes é totalmente recomendável, ao investir, também, na multidisciplinaridade. Para isso, uma mudança de postura se faz necessária, saindo do lugar do “dono da solução” para o de investigador da “melhor pergunta”.

Considerando que os melhores problemas estão fora da universidade, e que são estes os mais complexos, que misturam áreas, que não moram nas caixinhas disciplinares… São também os mais dinâmicos, aqueles que surgem com o vício das redes sociais, com o excesso de comidas processadas, com o sedentarismo, com o retorno de monstros do passado vestidos com roupas novas…

Para enfrentá-los com o que a ciência provê à formação de cada cientista, é fundamental revestir ações em pele orgânica, viva, mutante, adequando capacidade de solução àquilo que de fato impacte a vida das pessoas.

É preciso uma ciência emancipada, guiada por um povo consciente de seu papel de financiador do Estado e organizado para que seus cientistas criem soluções para suas demandas.

Esta camuflagem conceitual permite que um fluxo crítico seja invertido: ao invés do cientista ir à sociedade convencê-la da importância de suas descobertas, é a sociedade que vai até o cientista para convencê-lo a investir seu tempo na busca por soluções para problemas que a afligem.

Para inverter esta pirâmide de prioridades, é fundamental incluir a extensão na formação de nossos pesquisadores como atividade rotineira e de compromisso social, pois falar em extensão é tratar também dos problemas de quem está à mercê de investimento. Ser sensível à realidade do povo desassistido a ponto de realinhar os rumos de sua pesquisa é missão nobre do pesquisador comprometido socialmente.

Sabemos que há um encanto (uma dependência) do pesquisador com as fontes de financiamento, que praticamente ditam os passos futuros de seu trabalho. Sem elas, o laboratório quebra. Esta é uma realidade. Mas não podemos deixar de acreditar que há de existir, no entanto, uma válvula de escape para a utopia. Uma ciência emancipada e para o povo. Um povo consciente de seu papel de pagador de impostos e financiador da máquina pública e que se organiza para fazer os seus cientistas construírem suas soluções.

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Helinando Oliveira é físico, professor titular da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e atualmente é vice presidente da Academia Pernambucana de Ciência