Professor Breno Freitas, da Universidade Federal do Ceará, trabalha com abelhas, com foco na polinização agrícola. (Foto: Cedida)

Breno Freitas: abelhas na agricultura, com foco na produção de alimentos e na sustentabilidade

(Mônica Costa)

Um relatório da Agência Bori, em parceria com a Overton, revelou os 107 cientistas brasileiros mais citados em documentos de políticas públicas no mundo. Os pesquisadores ajudaram a embasar mais de 33 mil decisões desde 2019. Para chegar à lista, Bori e Overton identificaram pesquisadoras e pesquisadores brasileiros mencionados em documentos estratégicos, relatórios técnicos e pareceres usados por governos, organismos internacionais e organizações da sociedade civil, cada um com pelo menos 150 citações. Encabeçada por pesquisadores do Sudeste, a lista conta com cinco pesquisadores que desenvolvem seus trabalhos em instituições nordestinas.

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Entre os cinco, está Breno Magalhães Freitas, professor titular da Universidade Federal do Ceará, que trabalha com abelhas, com foco na polinização agrícola, na segurança alimentar, no aumento da renda de agricultores e produtores e na conservação ambiental. O relatório apontou que Freitas teve 39 trabalhos acadêmicos mencionados em 252 documentos de políticas públicas.

Entre os documentos mundiais relacionados a políticas públicas que citaram estudos do cientista cearense consta o Mudanças Climáticas 2022: Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade, organizado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, órgão das Nações Unidas para as mudanças climáticas (IPCC). No Brasil, o livro Efeitos letais dos pesticidas agrícolas sobre polinizadores e perspectivas de manejo para os agroecossistemas brasileiros, do pesquisador é citado no Plano de Manejo do Parque Estadual Nascentes do Rio Taquiri, realizado pelo Governo do Estado de Mato Grosso do Sul.

Gerando conhecimento aplicado

(Foto: Cedida)

Em entrevista ao Portal Nossa Ciência, o professor falou sobre o significado, para sua carreira científica, de figurar na lista dos 107 pesquisadores brasileiros mais citados em documentos que fundamentam políticas públicas em todo o mundo. Freitas respondeu que isso lhe traz grande satisfação, não simplesmente por integrar uma lista de pesquisadores mais citados, mas por estar entre aqueles cujos trabalhos servem de base para tomadas de decisão e para a formulação de políticas públicas. Explicou que suas pesquisas geram conhecimento aplicado tanto para governos quanto para a população em geral, o que considera especialmente gratificante, já que acredita que todo pesquisador deseja que suas investigações tenham utilidade para a comunidade.

O membro do Conselho da Comissão Internacional para a Relação Planta-Polinizador (ICPPR), membro da Comissão de Polinização e Flora Apícola da Federação Internacional de Associações de Apicultores (Apimondia) destacou que sua pesquisa dialoga com diversas áreas, razão pela qual acaba sendo citado em tantos documentos distintos, já que seu trabalho permeia diferentes aspectos relacionados ao tema.

Ao comentar sobre o fato de que, entre os 107 pesquisadores brasileiros mais citados em documentos que embasam políticas públicas, apenas cinco trabalham em instituições do Nordeste, menos de 5% do total, ele afirmou que “os holofotes, de uma maneira geral, são voltados para os Estados do Sul e Sudeste” e que “a maior parte dos recursos está lá”. Explicou que as dificuldades de financiamento na região são expressivas e que “não se pode comparar uma fundação estadual com a Fapesp”, lembrando que esta última, há dez anos, “aprovava um projeto de mais de um milhão de dólares”.

Por esse motivo, segundo ele, torna-se mais difícil desenvolver projetos de grande impacto no Nordeste. Acrescentou também que, nessas regiões mais favorecidas, há um grande número de instituições consolidadas e que, por proximidade, os pesquisadores tendem a formar grupos entre si. Disse que, por isso, “a gente aqui do Nordeste, para furar a bolha, é um pouco mais difícil”, sendo necessário adotar “uma forma de ação, uma abordagem diferente”.

As abelhas são essenciais para a produção agrícola

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O pesquisador observou ainda que sua própria visibilidade pode estar relacionada às especificidades de sua área de atuação. Explicou que trabalha com abelhas, mas não apenas do ponto de vista biológico; atua na interface com a agricultura, com foco na produção de alimentos e na sustentabilidade, o que, segundo ele, “dá um diferencial”. Ressaltou que muitos profissionais da agronomia concentram-se em temas como melhoramento vegetal, adubação, irrigação, solos ou controle de pragas, enquanto poucos abordam “esse viés da polinização da produtividade”.

Por outro lado, quem pesquisa abelhas geralmente enfatiza a biologia do inseto, sem priorizar a polinização agrícola. Destacou também que, mesmo quando o tema é polinização, costuma-se tratar dos ecossistemas e dos entornos das áreas cultivadas, “mas não a criação, o manejo da abelha dentro da área”. Ele concluiu dizendo que sua atuação nesse campo específico o coloca entre os poucos pesquisadores que realizam esse tipo de trabalho, o que acaba gerando maior destaque. E é justamente essa visibilidade que remete ao fato de que sua pesquisa é desenvolvida no Nordeste.

Ao ser questionado sobre as principais contribuições das pesquisas com abelhas para orientar decisões relacionadas à conservação ambiental e à segurança alimentar no Brasil, o pesquisador explicou que seus estudos demonstram de forma clara “que as abelhas são essenciais para a produção agrícola”. Ele argumentou que todos os esforços de manejo, passando pelo preparo de solo, escolha de mudas, adubação, irrigação e controle de pragas, tornam-se insuficientes se, no momento da floração, não houver abelhas presentes para realizar a polinização necessária para que cada planta atinja seu potencial máximo de produtividade.

O cientista observou que algumas plantas conseguem se autopolinizar, mas ainda assim produzem abaixo de sua capacidade quando não contam com o serviço das abelhas. Por isso, ressaltou que “a abelha vai fazer com que cada planta produza o máximo”, garantindo maior retorno para o investimento agrícola, ampliando a lucratividade e fortalecendo a sustentabilidade. Ele recordou que a presença de abelhas normalmente leva os produtores a reduzir o uso de agrotóxicos e que o aumento da produtividade promovido pela polinização evita a necessidade de abrir novas áreas agrícolas, uma vez que “se eu aumentar, por exemplo, 30% da produção dessa área aqui, eu não vou precisar desmatar mais 30% de área para produzir aquele mesmo tanto”.

Conservação ambiental

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O autor e coordenador da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) citou ainda estudos com soja que embasaram políticas públicas: ao calcular o ganho de produtividade proporcionado pelas abelhas e multiplicá-lo pela área mundial plantada, sua equipe mostrou que seria possível poupar milhões de hectares que, de outra forma, precisariam ser desmatados para alcançar o mesmo nível de produção sem polinizadores.

O pesquisador também destacou as contribuições da meliponicultura e da apicultura para a conservação ambiental. Ele explicou que, ao coletarem néctar e pólen, as abelhas realizam a polinização das matas, aumentando o banco de sementes e promovendo o crescimento de novas plantas. Lembrou que, ao crescerem, essas mudas fixam carbono, pois “50% da árvore é carbono”, contribuindo para o equilíbrio ecológico e para a manutenção das florestas.

Ao sintetizar esses resultados, o cientista reforçou que “tanto do ponto de vista da agricultura como do ponto de vista da conservação, a gente tem mostrado que as abelhas podem contribuir e que se pode utilizar essas informações em programas práticos que dão resultado”.

Ao comentar as evidências reveladas por suas pesquisas sobre os impactos do uso de agroquímicos e da perda de habitats nas populações de abelhas nativas e exóticas no Nordeste, o pesquisador explicou que esse tema não é o foco central de seus estudos, voltados principalmente para a polinização agrícola. Mesmo assim, acrescentou que diversos trabalhos, embora não necessariamente seus, demonstram o quanto as abelhas são sensíveis às alterações ambientais, especialmente à perda de habitat. Como exemplo, relatou que “a abelha jandaíra já foi uma abelha que ocorreu no Nordeste todo. Hoje ela está restrita a certas áreas onde ela encontra condições favoráveis”.

O cientista descreveu que, em regiões muito desmatadas, essas abelhas não encontram árvores com ocos para fazerem seus ninhos ou alimento disponível durante todo o ano. Ele observou que “as pessoas costumam associar a abelha àquela época de abundância de flores quando elas estão produzindo mel. Mas esquecem que a abelha tem que passar o ano todo lá”, necessitando de recursos suficientes mesmo nos períodos de escassez. Em sua avaliação, a retirada da vegetação, especialmente na caatinga, onde a derrubada para carvão, pastagem ou lenha é significativa, afeta diversas espécies, principalmente as abelhas sem ferrão, cujas colônias morrem de fome quando não encontram alimento ao redor, já que as rainhas não podem voar longas distâncias.

O professor comentou também sobre a espécie exótica Apis mellifera, destacando que, diferentemente das nativas, ela possui capacidade de migração. Segundo ele, quando falta alimento em um local, essas abelhas se deslocam para áreas mais favoráveis, característica que contribuiu para sua ampla adaptação no país, inclusive no Nordeste.

Ao tratar dos agrotóxicos, o pesquisador explicou que seu impacto está diretamente relacionado às áreas agrícolas, já que não são aplicados sobre a vegetação nativa. Nas lavouras, porém, representam um grande problema, pois, como afirmou, “você está matando quem está lhe ajudando. A abelha está lá para polinizar, enquanto o uso do agrotóxico é bastante prejudicial”.

Agricultores X apicultores

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Ao ser questionado sobre se atualmente a relação dos agricultores com as abelhas é pacífica ou conflituosa, o pesquisador explicou que essa relação tem mudado significativamente ao longo dos anos. Ele afirmou que “na hora que você começa a mostrar ao agricultor o benefício que as abelhas trazem, ele já começa a buscar alternativas ao agrotóxico”. Relatou que, quando iniciou seus trabalhos com polinização do melão, há cerca de vinte anos, as colmeias eram colocadas nas plantações mesmo com a expectativa de que morreriam, pois, embora o melão dependesse de abelhas, os produtores realizavam pulverizações intensas com veneno. Hoje, segundo o cientista, a situação é bem diferente: os agricultores evitam pulverizar durante a florada, que é o período crítico, e, quando a aplicação é inevitável, fazem de forma localizada, à noite, para reduzir danos.

O professor comentou que, embora esse cenário ainda esteja longe de uma agricultura totalmente orgânica, houve grande avanço em diversas culturas. Ele citou, como exemplo recente, a soja. Recordou episódios de mortandade de colônias de Apis mellifera no Rio Grande do Sul, quando abelhas instaladas próximas à lavoura foram expostas a pulverizações durante a florada. Disse que esse tipo de ocorrência diminuiu bastante, em parte porque “agora, finalmente, os agricultores da soja estão começando a ver que as abelhas aumentam a produção da soja”, o que tem levado a um diálogo crescente entre agricultores e apicultores.

O pesquisador ressaltou que, no passado, o grande problema era a falta de comunicação: apicultores instalavam colmeias perto da soja sem avisar, e agricultores pulverizavam sem considerar a presença das abelhas. Hoje, porém, essa postura vem mudando em diversas culturas, como o café, a soja e o melão, e os produtores já adaptam seus sistemas de manejo “para adequar as abelhas, para minimizar o impacto negativo”.

Ele destacou ainda que essa mudança de atitude traz benefícios adicionais. Segundo o apicultor, o uso responsável das abelhas valoriza o produto agrícola, pois inspeções de compradores internacionais reconhecem que áreas com grande presença de polinizadores tendem a usar pouco ou nenhum agrotóxico. Além disso, afirmou que essa transformação é positiva para toda a sociedade, já que as abelhas “nos ajudam nesse aspecto de mudar essa mentalidade”, contribuindo tanto para a saúde ambiental quanto humana.

“Transformações não são imediatas; levam tempo, e é preciso ter paciência”

Nossa Ciência: Como o senhor analisa a evolução da visão da sociedade sobre as abelhas?

(Foto: Cedida)

Breno Freitas: Isso é uma coisa que não muda do dia para a noite. Quando comecei a criar abelhas Apis há 42 anos, na fazenda do meu pai, os vizinhos diziam: “Isso é um doido, essas abelhas vão matar ele”. A apicultura era algo tão pouco comum que as pessoas só viam a questão da ferroada, do perigo, e achavam que eu acabaria morrendo com aquilo. À medida que fui criando e produzindo mel, a partir das plantas que eles consideravam mato, que não serviam para nada, e mostrando que eu estava explorando um recurso que a propriedade dava todos os anos e que era desperdiçado, eles começaram a perceber o valor da atividade. Sempre dizia: “Olha, aqui eu estou explorando um recurso que todo ano a propriedade me dá, essas várias flores, e que todo ano se perde”. E isso não me impedia de realizar nenhuma outra atividade. Com os resultados, os vizinhos começaram a criar também.

Ao longo desses 42 anos, a percepção foi mudando, embora não de uma hora para outra. Hoje, falar em apicultura ou meliponicultura não soa absurdo para ninguém; as pessoas entendem como atividades normais, valorizadas e até admiradas. O mesmo ocorreu quando comecei a trabalhar com abelhas na agricultura, em 1991. Ninguém falava nisso e ninguém queria que eu colocasse abelhas na área, porque achavam que elas iriam ferroar os funcionários e não acreditavam nos resultados. Isso não é ensinado nas escolas de agronomia, infelizmente, até hoje. Se você perguntar a qualquer agrônomo, ele dirá: “A polinização é importante”. Mas, se questionar como isso é feito ou se ele utiliza polinização assistida na área onde presta assistência, a resposta geralmente é negativa.

Muitas vezes, converso com os proprietários e eles se interessam, mas o agrônomo responsável afirma: “Não precisa disso não, a gente já progride assim”. Tanto que, por exemplo, nós, da UFC, conseguimos em 1989 ser uma das primeiras universidades do Brasil a incluir a disciplina de apicultura no curso de Agronomia. Depois, com a criação do curso de Zootecnia, a disciplina também entrou lá. E agora incluímos a disciplina de Polinização Agrícola na Agronomia. Nesse currículo implementado este ano na Universidade Federal do Ceará, a disciplina será ministrada entre o sétimo e o oitavo semestre. Então, daqui a uns três anos, os alunos que estão ingressando agora já estarão cursando essa disciplina. Pelo que sei, ela é a única do Brasil neste momento.

Essas transformações não são imediatas; levam tempo, e é preciso ter paciência. As pessoas às vezes me perguntam: “Professor, o senhor já está há 40 anos trabalhando com isso. O senhor não fica com raiva quando alguém chega e diz que não acredita?”. Eu respondo que não, porque isso faz parte do processo. Hoje, fico muito satisfeito em ver que as pessoas reconhecem a apicultura e a meliponicultura como atividades pecuárias legítimas, que é possível criar abelhas como qualquer outro animal.

Há um detalhe importante: conseguimos levar à população em geral a informação de que as abelhas são importantes para a produção de alimentos, que elas polinizam. Se você conversa com um motorista de Uber, de táxi, ou com alguém em um posto de saúde, todos sabem que as abelhas são importantes. O que falta agora, e estamos trabalhando nisso, eu e vários colegas, é fazer com que as pessoas entendam por que elas são importantes, como isso acontece e, claro, recebam informação correta. Infelizmente, com as redes sociais, muitos divulgam fake news de propósito, só para bagunçar tudo. Outros criam blogs e precisam de notícias, então pegam qualquer coisa superficial e acabam divulgando informações incorretas.

Um exemplo é aquela história de que Einstein teria dito que, se as abelhas desaparecessem da Terra, a humanidade acabaria em quatro anos. Isso não procede. A base da nossa alimentação são plantas polinizadas pelo vento, como arroz, trigo, milho, cana-de-açúcar, batata, que não dependem das abelhas. Ninguém morrerá de fome por causa disso. O que teríamos seriam desequilíbrios nutricionais, porque essas fontes são basicamente carboidratos. Vitaminas, minerais e uma série de nutrientes que precisamos vêm principalmente de frutas e verduras, que dependem altamente das abelhas. Sem elas, no mínimo, o preço desses alimentos ficaria muito caro, pois teríamos de polinizar manualmente, como já ocorre com o maracujá, encarecendo o produto e restringindo seu acesso. Em outros casos, nem haveria alimento suficiente.

É isso que precisamos esclarecer para a população: que entendam a real importância das abelhas e não se deixem levar por informações exageradas ou incorretas.

Nossa Ciência: Pensando no futuro, que medidas o senhor considera urgentes para conciliar o avanço tecnológico na agricultura com a conservação de abelhas e a manutenção dos serviços ecossistêmicos essenciais que elas prestam?

Breno Freitas: O que é preciso é a gente levar essa informação da importância da abelha, do serviço ecossistêmico que ela faz e da contribuição que ela tem para a agricultura ao produtor. O produtor tem que saber; do mesmo jeito que uma empresa, quando quer vender um drone para ele, quando quer vender um pesticida para ele, ela tem seus agrônomos ou seus agentes que vão lá, que mostram: “Olha, isso aqui é bom por isso, isso aqui faz não sei o quê” e tal. Então, a gente tem que fazer essa informação chegar ao produtor.

Porque o que acontece hoje é como eu lhe falei: o produtor não aprende isso nas escolas. O agrônomo que está dando assistência a ele também não está aprendendo isso. Infelizmente, o nosso sistema de extensão rural está muito depauperado.

E também o extensionista não está sabendo disso, a esse nível. Então, a gente precisa, na verdade… Eu estive agora, na semana passada, numa reunião lá em Brasília com o pessoal do Ministério da Agricultura, que era exatamente sobre a questão do uso das abelhas como bioinsumos, e a gente colocou isso lá: que o grande problema é o agricultor saber, ele ter acesso a essa informação e ele entender. Na hora que ele entender a importância que as abelhas têm para o trabalho dele, então ele vai se preocupar em deixar faixas de mata entre as áreas, em não fazer áreas tão grandes, em evitar ao máximo pulverizar, em conservar a vegetação do entorno, porque essa vegetação vai fornecer também polinizadores nativos.

Então existe uma conscientização, uma mudança de ideia. Ou seja: eu não vou produzir menos; ao contrário, eu vou produzir mais, só que eu vou mudar. Na hora que ele incorporar as abelhas ao sistema de produção dele, então a gente vai ter todas essas coisas que eu já falei: todos esses benefícios de aumento de produtividade, melhoria de qualidade de fruto, diminuição de uso de pesticida, maior sustentabilidade.

Até, vamos dizer assim, a marca dele vai ganhar melhor visibilidade, porque ele pode botar lá que é “polinizado por abelhas”, e isso, para esses órgãos certificadores, e para a população de uma maneira geral, é um apelo comercial. É uma coisa que também mostra que ele é uma pessoa que está preocupada e está conservando o meio ambiente. E você viu que agora isso está bastante em voga.

Várias ações a gente vê o tempo todo, inclusive agora vários projetos de reflorestamento de mata. A própria Caatinga: antes eu via aquela preocupação com a Amazônia, via a preocupação com a Mata Atlântica, via aquela preocupação com o Cerrado, que eu achava muito justa, que tinha que ter mesmo, mas ninguém falava da Caatinga. E agora não: agora a Caatinga está sendo falada, a Caatinga está sendo reflorestada com alguns projetos. Então também não foi da noite para o dia; foi um processo, até que chegaram e viram que a Caatinga também era um bioma importante dentro do Brasil.

Então, a mesma coisa: eu acredito que na hora que a informação chegar com base para o agricultor e ele entender isso, a gente vai ter algo bem mais sustentável e produtivo.

Nossa Ciência: Que conselho o senhor daria a quem deseja seguir a carreira científica e, quem sabe, daqui a 40 anos, ter o nome entre os 107 pesquisadores mais citados em políticas públicas?

Breno Freitas: Eu diria a qualquer estudante que está começando a carreira que é fundamental trabalhar com aquilo de que se gosta e acreditar no próprio trabalho. Em qualquer área da ciência, é possível fazer pesquisas que exigem milhões de dólares, mas também há estudos mais simples, acessíveis, que podem trazer contribuições importantes, especialmente aqui no Nordeste.

A Caatinga está no nosso quintal. Se nós não estudarmos esse bioma, quem vai estudar? O mesmo vale para nossas abelhas nativas. A jandaíra, por exemplo: hoje ela é bastante pesquisada, mas por muito tempo ninguém se dedicou a estudá-la. Só quando pesquisadores do Nordeste, e alguns de outras regiões que vieram para cá, começaram a trabalhar com essa espécie é que o conhecimento avançou. Se não fizermos isso, não será um americano ou um europeu que vai fazer: eles pesquisam o que é relevante para seus países. Essa é uma consciência essencial para qualquer pesquisador.

Eu mesmo cheguei às abelhas pela Agronomia. Na época, no Ceará, a Agronomia abrangia tanto plantas quanto animais, já que não havia um curso de Zootecnia. E eu queria algo diferente, não queria seguir o caminho que todo mundo seguia. Lembro que, no meu primeiro semestre, anunciei que faria um curso de Apicultura. Me disseram: “Você é doido? No Nordeste é tudo seco, não tem flor!”. Eu pensei: “Se tem gente criando abelha aqui, alguma coisa deve ter.” Fui atrás, gostei e mergulhei no assunto.

Outro ponto importante é identificar os gaps de conhecimento: o que é essencial saber sobre o tema e que ainda não foi estudado? E, dentro disso, o que é possível pesquisar com os recursos disponíveis? Criatividade conta muito. No meu doutorado, no Reino Unido, eu trabalhava com microscopia eletrônica , uma tecnologia avançada para a época. Quando voltei à UFC, isso era impensável. Eu poderia ter desistido e dito: “Sem esse equipamento, não dá para pesquisar”. Mas preferi ir para o campo. Com um carro, gasolina e alguns alunos, reunimos dados e fizemos pesquisas relevantes, como levantar o potencial da Caatinga para a apicultura.

Para quem está começando agora, o recado é esse: trabalhe com o que gosta, identifique as lacunas do conhecimento e veja como pode contribuir com os recursos que tem. E não se acomode. Muita gente pergunta como consigo fazer tanto dentro do meu horário. Simples: eu realmente trabalho dentro do meu horário. Chego às oito, saio às seis. Às vezes fico um pouco mais, mas evito trabalhar em casa e evito fins de semana. Durante a semana, porém, trabalho intensamente. É assim que as coisas acontecem.

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