(Gláucio Brandão)
Aplicar o PATOV, a JTBD e o nudge na prática é como mirar no coração das decisões humanas que atravessam perfis, mercados e culturas. A ideia desta (aula condensada) AC é sugerir arquiteturas decisórias que atendam a mecanismos universais, aqueles que qualquer pessoa, em qualquer lugar, experimenta. Acompanhe-me nesse texto, pois, ao estilo GBB-San, tentarei integrar esses três pilares estratégicos. Quem sabe isso não ajude você a encaixar melhor a proposta de valor de seu negócio num mercado caótico e competitivo?
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O erro fatal dos grandes produtos que fracassam
Não só startups como empresas bilionárias lançam produtos espetaculares que morrem no mercado. O problema não é engenharia ruim ou marketing insuficiente. É incompreensão básica sobre como humanos tomam decisões, e a solução não está em perguntar “o que o cliente quer?”, mas em decodificar como ele decide, uma decodificação que acontece em três camadas: biológica, psicológica e contextual.
Camada 1: PATOV, o cliente universal existe. Antes de qualquer persona ou segmentação, existe um fato biológico: somos escravos dos nossos sentidos. O Cliente Universal não tem idade, renda ou geografia. Tem PATOV: Paladar, Audição, Tato, Olfato e Visão. Levando esse conceito a termo, a decisão estratégica fica simples, pois pode-se pensar na quantidade de sentidos que sua solução ativa:
- Se apenas um sentido, ele é uma solução funcional. Boa, mas “fraquinha”. Veja o por quê na nossa última AC, A hiperdimensionalidade das propostas de valor.
- Se toca múltiplos sentidos, a experiência será memorável, mas poderá ser esquecida ou confundida com outras.
- “Batendo” em todos os sentidos, “Barbaridade, chê!”, apresentará uma sinestesia irresistível (Ponto S). Até seus netos saberão do que você gostava.
A Apple não vende computadores, vende sinestesia: o clique do trackpad (tato), o brilho da tela (visão), o som de inicialização (audição). Cada sentido ativado multiplica a proposta de valor.
Camada 2: JTBD, a tarefa invisível que Importa: Ativar sentidos é poderoso, mas inútil se você resolve o problema errado. Jobs To Be Done revela que ninguém compra produtos: contrata soluções para tarefas específicas. O McDonald’s descobriu que clientes não queriam sanduíches melhores no café da manhã. Queriam “matar tempo e fome no trânsito”. A solução? Milkshake num copão, fácil de consumir dirigindo e demorado o suficiente para ocupar a viagem e chegar ao destino esquecendo do tempo “perdido”.
De acordo com o professor Christensen, toda tarefa tem três dimensões: funcional (o que resolve), emocional (como faz sentir) e social (como projeta identidade). Acrescente aí a tríade cerebral: o reptiliano domina, o emocional vence o intelectual, e a razão vem sempre por último. Ignore o instinto e a emoção, e perca a guerra para a concorrência.
Camada 3: Nudge, o ambiente que decide por você: Com sentidos ativados (PATOV) e tarefa mapeada (JTBD), resta projetar o contexto para que a decisão aconteça sem atrito. Isso é Nudge, que em português pode ser traduzido como “empurrãozinho”, uma arquitetura da escolha, conceito novo por estas bandas, que trago da Wikipédia: “Refere-se a uma técnica ou abordagem que visa influenciar o comportamento das pessoas de forma sutil e não coercitiva, direcionando-as para escolhas mais desejáveis ou benéficas, sem restringir suas liberdades. O conceito, popularizado pelo economista Richard Thaler, explora o uso da arquitetura de escolha para facilitar decisões mais saudáveis ou vantajosas, tanto no âmbito individual quanto social”.
Antes que você possa achar que é um papo coach, não se trata de manipulação barata. É design intencional do ambiente decisório através de três princípios:
- Default. A opção padrão sempre vence (Netflix já deixa o próximo episódio carregando).
- Saliência. O que brilha é o que vende (botão laranja da Amazon).
- Prova social. Ninguém quer ser o único diferente (“9 de 10 dentistas recomendam”).
A Amazon não empurra nada. Apenas sugere: “quem comprou isto também levou aquilo”. Esse empurrãozinho sutil aumenta ticket médio globalmente.
Juntando tudo radicalmente: decidindo como um arquiteto
Empreendedores desavisados escolhem uma das três abordagens. Visionários integram as três. Vejamos o case App de fitness:
- PATOV: interface limpa (visão) / trilha motivacional (audição) / vibração de conquista (tato).
- JTBD: funcional = manter forma / emocional = sentir orgulho / social = impressionar amigos.
- Nudge: botão “treinar agora” já ativo (default) / ranking público (prova social) / cores de progresso em destaque (saliência).
O resultado: adesão explosiva, retenção alta, monetização previsível.
A arquitetura da decisão irresistível: Se eu fosse botar num framework estratégico, a lógica decisória teria mais ou menos essa cara:
1- Mapear sentidos → Qual PATOV ativamos?
2- Decodificar a JTBD → Que tarefa realmente resolvemos?
3- Projetar contexto → Quais nudges aceleram a escolha?
Isso eliminaria o achismo e converteria você de “inventor de features” em arquiteto de decisões. Não se trata de dom ou arte. É arquitetura.
Resolver o universal é resolver para milhares
Mercados fragmentados, clientes dispersos, concorrência global. No caos, uma certeza permanece: resolver um problema universal é resolver o problema de milhares. Quem domina, vou chamar assim, a estratégia PATOV + JTBD + Nudge, não vende produtos, cria experiências sinestésicas que resolvem jobs invisíveis através de escolhas inevitáveis. Essa é a diferença entre startups que imploram atenção e empresas que constroem marcas.
A arquitetura da decisão não é teoria. É a engenharia do inevitável, pois torna sua proposta de valor inderrubável, capaz de programar futuros! Resolver um problema universal é desbloquear o comportamento humano em escala. Os negócios que precisam disso não devem apenas buscar agradar clientes; precisam arquitetar decisões que transformam milhões em legião, em tribos, como diz Seth Godin. Esse é o poder real da inovação.
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Gláucio Brandão é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e autor do livro Triztorming









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