(Helinando Oliveira)
Que triste notícia recebemos neste fim de semana: a passagem, o encantamento, do querido escritor Luis Fernando Verissimo. Famoso por suas crônicas inteligentes e sua vocação humorística, com mais de 80 livros publicados, o autor de Ed Mort e Outras Histórias e Comédias da Vida Privada foi também roteirista da TV Pirata.
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Filho do lendário Érico Verissimo, autor de Olhai os Lírios do Campo e O Tempo e o Vento, Luis Fernando Verissimo agora se junta ao pai, a Ariano Suassuna, a Millôr Fernandes e a tantos outros brilhantes escritores com o dom de nos levar do riso às lágrimas.
Nunca tive a oportunidade de abraçar nenhum deles, embora seja abraçado a todo momento em que leio suas palavras e seus conselhos. E este é o poder imortalizado nos livros, crônicas e textos. Aprendi com Rubem Alves, em seu livro Palavras que Curam, a lição das duas caixas de Santo Agostinho: ele dizia que, na mão direita, levamos ferramentas, ou seja, tudo aquilo que nos dá poder, meios de viver. Carrego nesta caixa um monte de equipamentos, equações de Maxwell, computadores e outras coisas mais.
Na mão esquerda, no entanto, levamos uma caixa de brinquedos, que são inúteis para nos dar poder, mas que são razões para viver. Nesta caixa levo pequenas pedras dos lugares por onde andei, areia da praia, brinquedos da minha infância, uma cópia de Olhai os Lírios do Campo já surrada por ter sido tantas vezes lida, a emoção do meu último abraço em meu pai, o cheiro doce dos cabelos de minha mãe… Esta caixa, como diz Santo Agostinho, não paga as contas do meu dia, mas me traz motivação e alegria para viver.
Sempre tento empurrar meus textos do portal Nossa Ciência para a caixa da direita dos leitores, com conteúdo científico e tecnológico, embora a escrita sempre saia da minha caixa da esquerda. Desta vez, quero jogar da esquerda para a esquerda, de coração para coração, como numa alegoria simbólica ao sentimento de nosso homenageado de hoje, quando diz:
“Eu não entendo como uma pessoa que enxerga o país à sua volta, vive suas desigualdades e sabe a causa das suas misérias pode não ser de esquerda.”
Desejo que, neste momento, lá do outro lado, Érico esteja lendo para seu filho as mais belas passagens de Olhai os Lírios do Campo, como esta:
“Mas progresso é um meio e não um fim. Progresso: meio para atingir o conforto, o bem-estar, a felicidade. Mas um homem não deve querer tudo isso só para si e para os seus. Deve desejar o bem-estar de toda a humanidade.”
Obrigado, Luis Fernando Verissimo. Suas palavras ficarão para sempre.
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Helinando Oliveira é físico, professor titular da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e atualmente é vice presidente da Academia Pernambucana de Ciência









Que esplêndido , triste e belo.
Queria abrir um parêntese sobre a Caixa de Ferramentas. Esta foi a parte que mais me tocou no livro Palavras para desatar nós — inclusive reli ontem! Na sua crônica, você cita o livro Palavras que curam. Eu não sabia que o Rubem havia trazido essa reflexão tão linda também em outra obra dele.
Que belo reencontro entre textos e memórias! Certas palavras ecoam em diferentes lugares e tempos, como se estivessem sempre à espera de quem as acolha.