John Clarke, Michel Devoret e John Martinis, todos da Universidade da Califórnia. (Imagem: Reprodução Real Academia Sueca de Ciência)

E o Nobel de Física vai para …

(Helinando Oliveira)

Não, caro leitor, a coluna não está repetida. Na semana passada, falamos sobre os ganhadores do Prêmio Nobel de Química. Hoje, o assunto é outro prêmio. O Prêmio Nobel de Física de 2025 foi dedicado ao tunelamento quântico macroscópico e à quantização de energia em circuitos elétricos e homenageou os cientistas John Clarke, Michel Devoret e John Martinis, todos da Universidade da Califórnia.

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Para entendermos a importância deste prêmio, precisaremos conversar um pouco sobre as diferenças entre as físicas clássica e quântica. Podemos começar esta história distinguindo a existência de duas realidades, dois sentimentos, ou sensos. O senso comum de nosso mundo macroscópico é o que vivemos na nossa rotina. Coisas colidem, caem, aceleram, param. E nossos melhores exemplos são os automóveis, nossos corpos, os prédios.

Quando passamos para o mundo das coisas muito pequenas, nosso senso deixa de funcionar, pois o regime quântico controla esses processos, que são estranhos para nós, que vivemos em outra escala. Por exemplo: para ver o que está do outro lado do muro, no mundo clássico, precisamos ter energia para escalar o muro, saltá-lo e observar… Lá no mundo quântico, não é bem assim: partículas dispõem de probabilidade não nula de atravessar barreiras de potencial, mesmo que não tenham energia suficiente para saltá-las. Este é o tunelamento quântico.

Estar dos dois lados da parede

Em uma interpretação livre do mundo clássico, este processo é tão difícil de entender quanto dizer que alguém se atirou contra uma parede e apareceu do outro lado, ou, melhor, que a probabilidade de alguém estar em ambos os lados da parede seja diferente de zero. Nosso mundo clássico rejeita estas hipóteses, como se ouvisse do próprio Arquimedes: “Dê-me uma alavanca e um ponto de apoio e levantarei o mundo”. Que ousadia colocar em questão os conceitos exatos de posição e de velocidade! Nossa definição de matéria é tão dura quanto a mais rígida das barras de metal.  E, mesmo assim, ela permanece composta por átomos, com toda a sua quântica.

Pois então! Nossos laureados, na década de 1980, mostraram que o tunelamento estranho do mundo quântico também ocorre no mundo clássico. Eles montaram um sanduíche de supercondutores, formando uma junção Josephson pela separação de uma fina camada dielétrica, e mostraram que o tunelamento poderia ser medido do lado de cá, em um circuito eletrônico macroscópico. E, neste circuito eletrônico, a energia também era quantizada!

Esse experimento simplesmente abriu as portas para o computador quântico, com seus qubits, ao usar a superposição de estados para alcançar uma capacidade superior de processamento, que deixa de considerar os níveis 0 ou 1 e passa a tratar da superposição de ambos, como se, ao mesmo tempo, pudessem ser 0 e 1. E não apenas a superposição, mas também a interferência quântica e o entrelaçamento.

Vale ressaltar que o trabalho dos laureados com o Nobel foi a comprovação experimental de um trabalho teórico do prof. Amir Caldeira citado no relatório do comitê da academia sueca para embasar o prêmio.

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Helinando Oliveira é físico, professor titular da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e atualmente é vice presidente da Academia Pernambucana de Ciência