Novidades na Medicina do Sono em 2025: alertas e importância da pesquisa científica

Chegamos ao final de 2025 e continuamos dormindo pouco e ainda não descobrimos tudo que ocorre no nosso corpo durante o sono, porém ainda continuamos a acreditar que o sono é fundamental para termos uma boa saúde física e mental. Aqui, descrevemos as principais novidades da área de medicina do sono em 2025.

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O ano de 2025 consolidou-se como um divisor de águas na Medicina do Sono, especialmente pela primeira vez foi demonstrado a eficácia de tratamentos farmacológicos para a apneia do sono, o real uso da Inteligência Artificial no diagnóstico e novas evidências da participação dos distúrbios do sono na fisiopatologia das doenças neurodegenerativas como Alzheimer.

Abaixo, detalho as descobertas e novidades mais impactantes, categorizadas por área de atuação:

1. A revolução para o tratamento da apneia: a pílula para SAOS

A Apneia do Sono é o distúrbio do sono mais grave e um dos mais prevalentes. O CPAP (Pressão Positiva Continua na Via Aérea) é o tratamento padrão-ouro para a Apneia Obstrutiva do Sono (AOS), um aparelho que fornece um fluxo contínuo de ar pressurizado através de uma máscara para manter as vias aéreas abertas, prevenindo os episódios de parada respiratória, ronco e melhorando a qualidade do sono e a saúde geral. Todavia, os resultados estão dependentes da adesão dos pacientes ao uso do CPAP.  A boa notícia e mais aguardada do ano foi a divulgação dos resultados positivos da Fase 3 do uso do medicamento AD109 (uma combinação de duas drogas: aroxybutynina e atomoxetina).

O Mecanismo de Ação (A Hipótese Noradrenérgica-Antimuscarínica)

Durante o sono, especialmente no estágio REM, ocorre uma “desativação” natural dos neurônios motores que controlam os músculos dilatadores da faringe (principalmente o músculo genioglosso).

O AD109 combina essas duas drogas para combater essa atonia de duas frentes:

  • Atomoxetina (Inibidor de Recaptação de Noradrenalina): tem a função de aumentar a disponibilidade de noradrenalina na fenda sináptica dos neurônios motores do hipoglosso.
  • Efeito: A noradrenalina é excitatória para o músculo genioglosso. Ao mantê-la ativa, o tônus muscular da via aérea é preservado, impedindo o colapso.
  • Aroxybutynina (Antimuscarínico): tem a função de bloquear os receptores muscarínicos que, durante o sono REM, inibem ativamente a musculatura.
  • Efeito: Remove o “freio” químico que causa a paralisia muscular do sono REM.

Este tratamento farmacológico é importante porque hoje, o tratamento padrão para a Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) é mecânico (CPAP ou aparelhos intraorais). O AD109 mostrou eficácia em reduzir o IAH (Índice de Apneia e Hipopneia) atacando a causa neuromuscular do colapso da via aérea. Isto abre as portas para tratar pacientes que não toleram o CPAP com uma simples medicação oral diária.

2. Tecnologia diagnóstica: o sonar do sono

No campo da tecnologia, o destaque foi o reconhecimento da Bairitone Health, vencedora do prêmio de inovação da (Associação Americana de Medicina do Sono) (AASM).

  • A Inovação: Eles desenvolveram uma “polissonografia anatômica” baseada em sonar. É um sistema não invasivo que usa ondas sonoras (como um sonar de submarino ou morcego) para mapear a via aérea do paciente enquanto ele dorme.
  • Impacto: Permite identificar onde exatamente a obstrução ocorre sem precisar de endoscopias invasivas ou cateteres, facilitando a escolha entre cirurgia, CPAP ou aparelho intraoral.

3. Neurociência e doenças neurodegenerativas

Já em 2021, em uma pesquisa em conjunto com os colegas espanhóis, mostramos que o padrão circadiano de repouso-atividade prevê o declínio cognitivo em pacientes com doença de Alzheimer leve a moderada. Agora, em 2025, a pesquisa científica solidificou a relação bidirecional entre o ciclo sono-vigília e doenças como Alzheimer e Parkinson. Não se trata mais apenas de saber que “dormir mal aumenta o risco”, mas sim de usar o sono como biomarcador.

  • Biomarcadores Precoces: Estudos apresentados no congresso SLEEP 2025 demonstraram que alterações específicas na arquitetura do sono (fragmentação e perda de ondas lentas) podem prever a neurodegeneração anos antes dos sintomas cognitivos.
  • Fatores Sociais: Pesquisas da University of Miami Miller School mostraram uma correlação direta entre discriminação social, inflamação crônica e sono ruim, aumentando o risco de Alzheimer em populações minoritárias. Isso trouxe um olhar de “saúde pública” urgente para a medicina do sono.

4. Inteligência artificial (IA) oficializada

A AASM (Associação Americana de Medicina do Sono) publicou posicionamentos oficiais atualizados sobre o uso de IA. A novidade de 2025 não é a “existência” da IA, mas a sua validação clínica.

  • Triagem em Massa: Algoritmos agora são capazes de analisar dados de wearables (relógios inteligentes) com precisão clínica para “pré-diagnosticar” distúrbios, servindo como funil para exames mais complexos.
  • Aumento da Capacidade Médica: A IA deixou de ser vista como uma substituta do médico e passou a ser tratada como ferramenta para lidar com a escassez global de especialistas, automatizando a pontuação (estadiamento) de exames de polissonografia com alta confiabilidade.

5. Cronobiologia e saúde vascular

Novos estudos, incluindo publicações ligadas à American Heart Association, revelaram mecanismos moleculares de como o ritmo circadiano protege (ou danifica) o sistema vascular.

  • O Risco da Madrugada: Foi descoberto que, em pacientes com apneia, o sistema circadiano interno “falha” em proteger os vasos sanguíneos durante a noite, explicando biologicamente por que ataques cardíacos são mais frequentes em apneicos durante o sono (especialmente por volta das 3 da manhã).

6. No Brasil: restrição e controle no uso de zolpidem

Em 2025 tivemos mudanças drásticas nas regras para a prescrição do zolpidem, principal medicamento usado para tratamento de insônia no Brasil. A razão fundamental para o endurecimento das regras é o aumento alarmante no uso irracional, abuso e risco de dependência desse medicamento no país. Sintetizando os dados disponíveis, observei que o número de caixas vendidas no Brasil cresceu 71% entre 2018 e 2020. Além disso, foram encontrados relatos de uso abusivo extremo, com indivíduos chegando a ingerir dezenas de comprimidos por dia. A ANVISA (RDC 871/2024) agiu para coibir esse cenário de crescimento de consumo e desvio de finalidade. O endurecimento no controle exige agora que o medicamento, independentemente da dosagem, seja vendido apenas mediante a Notificação de Receita ‘B’ (azul), o que força um monitoramento mais rigoroso de prescritores e usuários.

O ano de 2025 mostra o quanto a ciência é dinâmica e quanto precisamos investir e ciência. Para finalizarmos aproveitamos para desejar boas festa e que em 2026 todos e todas possam dormir tranquilamente e sonharem com um mundo melhor.

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John Fontenele Araujo é professor titular do Departamento de Fisiologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia da UFRN